segunda-feira, 15 de agosto de 2005

Finalmente o dia 14 de Agosto de 2005

O dia chegou, finalmente. O dia pelo qual aguardava há mais de 4 anos. Esse dia seria o dia em que estaria frente-a-frente com a banda que, literalmente, me enfeitiçou. Foi a 14 de Agosto de 2005, data que se tornou histórica para mim e que fará parte do quadro com os meus momentos de ouro. Foi o dia em que assisti pela primeira vez a um concerto dos U2.
No dia anterior tinha estado no Concha Bar. Foi a primeira vez em que estive com outras pessoas que têm uma admiração pelos U2 tal como eu a tenho, ou até em proporções muito superiores. Foi também aí que fiquei a conhecer uma banda de que ouvia falar há mais de 2 anos. São eles os 2U, banda de tributo aos U2 e, diga-se de passagem, que confirmaram todas as boas críticas que deles tinha lido. Sinal disso foi a rouquidão com que fiquei após a sua actuação.
A ansiedade que começou a tomar conta de mim uns dias antes fez-se sentir com grande intensidade no dia do concerto. Não dormi mais de duas horas e meia, estando a pé já às 3h30 da manhã para me preparar para rumar a Lisboa. Saí de casa pelas 5hoo. As ruas do Cacém, local onde vivo, estavam semi-desertas. Apenas circulavam alguns carros. Foi bom encontrar assim a cidade, pois são conhecidos os problemas de segurança que esta tem, e percorrer a essa hora o caminho até à estação de caminhos-de-ferro só em caso de extrema necessidade.
Chegado à estação de Entrecampos, em Lisboa, cerca das 6 a.m., debati-me com outro problema: o metro só começava a circular às 6h30. Nova caminhada, desta vez rumo ao destino final, o estádio Alvalade XXI, novamente debaixo da escuridão, mas desta vez com Lisboa como cenário.
Assim que cheguei a Alvalade, pelas 6h20, já se encontravam algumas centenas de pessoas a aguardar pela abertura das portas, algumas há mais de 24 horas! Foi então que me informaram que uma rapariga chamada Ana, e mais algumas pessoas, estava a fazer uma lista ordenada de pessoas. A eles o meu muito obrigado. Isto só vem provar o grande sentido de altruísmo dos fãs de U2. É uma honra pertencer a esta família.

610! Este era o meu número! Fiquei assim na fila a aguardar pelas 17h, altura em que as portas seriam abertas. Fiquei rodeado de espanhóis. Foram mais de 10h a ouvir castelhano à minha volta que quase me fizeram entrar em colapso. Fiquei então a saber que "nuestros hermanos" são doidos por pistachios e que jogam às cartas com baralhos com figuras fora do normal para nós, "portugas". Desde que a fila foi formada os acontecimentos foram os normais. A ida à casa de banho (experiência horrível), a olhadela no jornal, o gole de água, a dentada na sandes, o avanço e recuo da fila, a tentativa de descansar em pleno asfalto... tudo dentro da maior normalidade, com uma organização exemplar, tanto dos elementos da segurança como dos fãs que fizeram a lista.
O descalabro deu-se cerca das 15h quando um falso alarme de abertura de portas fez toda a gente correr selvaticamente para as grades junto à entrada para a garagem que dava acesso ao relvado do estádio. A partir dai foi quase impossível para a segurança reorganizar a fila pois a ansiedade em arranjar um bom local no relvado fez com que ninguém quisesse arredar pé junto das referidas grades. No entanto a organização conseguiu reordenaro a fila, já no interior da garagem. Talvez derivado do aumento gradual da temperatura houve alguma confusão, com algumas pessoas a reclamarem um lugar mais à frente, se calhar com toda a razão. Depois do falso alarme aqueles com maior experiência neste tipo de eventos conseguiram chegar-se mais à frente e aqueles mais novatos, em que eu me incluo, ficaram pior colocados. Foi também neste local que se viveu um confronto que era muito frequente há algumas centenas de anos atrás. Os espanhóis, que eram muito numerosos neste grupo, começaram a cantar em conjunto. Nós, portugueses, sentindo o nosso espaço a ser ocupado cantámos o hino nacional. A isto respondem os espanhóis com outra música (não sei se o hino) e nós ripostámos com um "Portugal, Portugal, Portugal". Os espanhóis, que tinham um vasto repertório de músicas bem ensaiadas, fazem-se novamente ouvir. Nós, sem muito mais temas conhecidos pela generalidade das pessoas, demos o troco num ruidoso "Atirei o pau ao gato". A partir daqui os espanhóis ganham claramente o confronto pois, como referi anteriormente, o seu repertório era muito vasto.
Faltava cada vez menos para a abertura das portas, mas não faltaria novo falso alarme e consequente desorganização da fila. Chegadas as 17h o grupo é dividido em dois, sendo que eu fiquei no 2º mini-grupo a entrar. Depois desta divisão e das diversas desorganizações o meu 610º lugar já lá ia e com ele a esperança de conseguir um bom lugar, isto é, bem coladinho ao palco ou a uma das duas passadeiras. No entanto existia uma réstia de esperança que me fez percorrer com a maior velocidade possível o percurso que dava acesso ao relvado. É aí que tenho uma miragem: o lado exterior da "passadeira do Edge" não estava completamente preenchida. Corro na sua direcção e agarro-me com toda a força às grades de separação. Nas próximas 7 horas e meia essa seria a minha residência!

Conheço então uma rapariga, que estava à minha esquerda, tremendamente ansiosa por ver os U2 e do meu lado direito um rapaz, com uma bandeira dos Estados Unidos, bem mais tranquilo. Pelo menos assim aparentava.
Até às 22h, hora em que os U2 entravam em cena, assisti a uns promissores Kaiser Chiefs, dancei algumas músicas que passavam no PA, troquei algumas palavras com as pessoas que me rodeavam, mandei uns murros nas bolas gigantes que percorriam o público, levei uns banhos de água para atenuar o calor que se fazia sentir e descobri do outro lado da passadeira uma loirinha lindíssima.

Et voilá... os mestres sobem ao palco e começam por nos brindar com um sempre enérgico Vertigo, em que os habituais "Unos, dos, tres, catorce!" são substituidos por uns aportuguesados "Um, dois, três, catorze!" que nos fazem vibrar. O set decorre maravilhosamente e eu não paro de cantar, de saltar, de estender a mão ao Bono, Adam e The Edge quando passam pela passadeira. Toda esta actividade, juntamente com o calor que se fazia sentir, fizeram-me perder alguns litros de suor, que foram compensados com água que tinha e que os seguranças gentilmente nos ofereciam. Uma palavra de apreço para com os seguranças que estiveram presentes no Alvalade XXI e que limparam a negativa imagem que eu tinha deles antes deste concerto. Todos com quem comuniquei foram bastante simpáticos.

Durante o set destaque para a energia de Elevation, Where the Streets Have No Name e para a minha favorita The Fly. Sobre o alinhamento não vou falar muito pois foi tudo tão rápido e tão intenso que ficaria insatisfeito com o resultado das minhas palavras. Destaque apenas para as tentativas do Bono em falar português, para a beleza dos efeitos do ecrã gigante em alguns temas e para os apelos humanitários do Bono.
Chega então ao fim o concerto com a banda a despedir-se com "40", chegando também ao fim a minha jornada de "baptismo" em concertos de U2. Fiquei completamente de rastos depois de tantas horas à espera e de um concerto que me fez vibrar até ao último segundo. Mas valeu a pena pois os U2 são fantásticos ao vivo e a experiência que passei ao longo de todo o dia foi única e muito enriquecedora.
Como disse um espanhol para uma TV portuguesa: Já posso morrer tranquilo!!!